segunda-feira, 1 de outubro de 2012

AS DIFERENTES MANEIRAS DE FAZER UM PARÁGRAFO


A. DECLARAÇÃO INICIAL

Esta é, parece-nos, a feição mais comum: o autor afirma ou nega alguma coisa logo de saída para, em seguida, justificar ou fundamentar a asserção, apresentando argumentos sob a forma de exemplos, confrontos, analogias, razões, restrições – fatos ou evidências.

Veja o exemplo de um parágrafo cujo tópico frasal é uma declaração acerca do tema liberação da maconha.

Perceba que após declarar a sua posição, o redator a fundamenta, deduzindo, pois, as razões que o levam a crer naquilo:

“É um grave erro a liberação da maconha. Provocará de imediato violenta elevação do consumo. O Estado perderá o precário controle que ainda existe sobre as drogas psicotrópicas e as instituições brasileiras de recuperação de viciados não terão estruturas suficientes para atender à demanda”.
(Alberto Corazza, Istoé, 20.12.95)

B) Definição ou explicação:

É uma forma muito presente nos textos dissertativos.  Exige do redator segurança intelectual, a fim de não apresentar uma definição equivocada.

Vejamos o exemplo trazido pelo livro “Encontros de Redação”, do professor Jayme Barros:

“A literatura é uma arte – a arte da palavra. Na sua natureza, ela tem origem na imaginação criadora, e não em outra faculdade do espírito. Não é sua finalidade ensinar nem divulgar mensagens religiosas ou políticas, ou moralizar. Isso não compete à Literatura”.
(Afrânio Coutinho. Crítica e poética. Rio de Janeiro,
Acadêmica, 1968, p.78)

C) Divisão:

É uma maneira bastante didática de construção do parágrafo. Segundo o professor Jayme, “o tópico frasal é apenas a discriminação das ideias que serão expostas”.

Vejamos um exemplo desse tipo de parágrafo dissertativo:

“A linguagem pode ser falada ou escrita, há assim dois tipos de exposição linguística. De maneira geral, podemos dizer que a primeira se comunica pelo ouvido e a segunda, pela visão. Ou em outros termos, na comunicação escrita, os sons que essencialmente constituem a linguagem humana passam a ser evocados mentalmente por meio de símbolos gráficos”.
(Matoso Câmara. Manual de expressão oral e escrita,
p. 15)

D) Oposição ou tema polêmico:

O redator estabelece o rumo da sua argumentação, a partir das duas ideias que se confrontam no parágrafo.

“De um lado, professores mal pagos, desestimulados, esquecidos pelo governo. De outro, gastos excessivos com computadores, antenas parabólicas, aparelhos de DVD. É este o paradoxo que vive hoje a educação do Brasil”.

Note, inclusive, que a presença das expressões “de um lado” e “de outro (lado)” já anunciam ao leitor que haverá um confronto de ideias ali.

E) Alusão histórica:

Esse tipo de construção do parágrafo requer, obviamente, do leitor um conhecimento seguro da história, para que ele, o redator, tenha condições de apresentar dados coerentes. Segundo o prof. Jayme Barros, esse caminho “desperta a curiosidade do leitor. Reportar-se a fatos históricos, lendas, tradições, anedotas ou acontecimentos. É artifício empregado por oradores e por cronistas que, com frequência, aproveitam incidentes do cotidiano como assunto ‘não apenas para um parágrafo, mas até para toda a crônica’”.

Veja um exemplo de um parágrafo que trata da globalização:

“Após a queda do Muro de Berlim, em 09 de novembro de 1989, acabaram-se os antagonismos leste-oeste e o mundo parece ter aberto de vez as portas para a globalização. As fronteiras foram derrubadas e a economia entrou em rota acelerada pela competição”.

F) Uma pergunta:

Com este recurso, o redator visa a chamar atenção do leitor para a ideia fundamental daquele parágrafo. É um recurso elegante, pois o redator chama, inevitavelmente, o leitor a acompanhá-lo naquele exercício de reflexão.
Perceba, todavia, que não se cria o vínculo direto redator x leitor, condenável no texto dissertativo, como se o primeiro estivesse “batendo papo” com o segundo. Por isso, devem ser evitadas palavras do tipo: você, eu, nós, nosso(a) e verbos em 1ª pessoa.

“Será que ainda é possível considerar-se o carnaval baiano uma festa popular? O crescente número de blocos que cobram elevados preços e a proliferação de camarotes ao longo dos trechos principais do percurso atestam o quanto o carnaval baiano vem priorizando a minoria da população que pode investir altas quantias em entidades carnavalescas e, consequentemente, diminuindo o espaço reservado ao folião comum, que, em tese, é o verdadeiro dono da festa”.
(Trecho de redação de aluno sobre tema da UFBA, 2002)

G) Confrontação espacial:

Esse tipo de parágrafo serve para a confrontação de duas regiões, duas áreas, duas localidades de uma mesma cidade, estado, país, ou não.

Para que o redator faça uma boa confrontação é necessário que ele conheça o assunto, as especificidades de cada lugar, para não fugir da realidade, não cometer erros, não contrariar a lógica.

Veja um exemplo:

“Itabuna e Ilhéus são duas cidades de tamanho médio do interior da Bahia. A primeira viveu por muito tempo sob a saga do cacau, conhecida por ser uma das maiores produtoras mundiais do fruto. Hoje, o seu ponto forte é o comércio e a prestação de serviço. Já a segunda, imortalizada pelos romances de Jorge Amado, desenvolveu-se com o seu porto e aeroporto, exportando chocolate para o mundo e também belas praias ou paisagens, incrementando assim o seu turismo”.

H) Adjetivação:

A partir dos adjetivos apresentados acerca de uma determinada ideia, o redator define a base para desenvolvê-la em seguida.

Veja o exemplo abaixo:

“Equivocada e pouco racional. Esta é a verdadeira adjetivação para a política atual do governo”.

I) Citação:

O redator traz ao seu texto um pensamento de outrem, coerente, é óbvio, com o que ele pretende defender no seu parágrafo. Este pensamento geralmente é colhido no mundo da cultura, da arte, da política, da filosofia, cujos pensadores, pela própria atividade intelectual que desenvolvem, constroem afirmações, observações muito inteligentes sobre os mais diversificados temas relacionados à vida humana. Ressalte-se que é indispensável ao redator apontar a autoria da frase, do pensamento que ele coloca em seu texto, para que sobre ele não recaia qualquer suspeita de falsidade ideológica.

“’Atualmente, as relações interpessoais estão sendo mediadas pelo material em detrimento do afetivo; assim estão batizadas predominantemente por jogos de interesse e poder’. Esse pensamento do psicoterapeuta e professor da UFRJ, Sócrates Nolasco traduz, com muita clareza, a pobreza das relações humanas contaminadas pelos princípios capitalistas”.

J) Citação indireta:

Devemos usar esta forma quando não sabemos reproduzir textualmente a citação que pretendemos registrar. A mente humana às vezes é traiçoeira e, por isso mesmo, recria fatos e pensamentos. Portanto, para nos salvaguardar de qualquer omissão ou invenção do que não é de nossa autoria quando não lembrarmos a ideia de forma exata, textual, recorremos à citação indireta, afinal, como salienta o prof. Antonio Viana, em Roteiro de Redação: “é melhor citar de forma indireta que de forma errada”.

“Para Marx a religião é o ópio do povo. Raymond Aron deu o troco: o marxismo é o ópio dos intelectuais. Mas nos Estados Unidos o ópio do povo é mesmo ir às compras. Como as modas americanas são contagiosas, é bom ver do que se trata”.
(Cláudio Moura e Castro, Veja, 13.11.96

K) Exposição de um ponto de vista oposto:

Apresenta-se um pensamento que será refutado, combatido pelo redator.

“O ministro da Educação se esforça para convencer de que o provão é fundamental para a melhoria da qualidade do ensino superior. Para isso vem ocupando espaços generosos na mídia e fazendo milionária campanha publicitária, ensinando como gastar mal o dinheiro que deveria ser investido na educação”.
(Orlando Silva Júnior e Eder Roberto Silva,
Folha de São Paulo, 05.11.96)
L) Retomada de um provérbio:

A partir de um dito popular, o escrevente fundamenta seu posicionamento defendido no parágrafo. Cuidado para não utilizar aforismos, máximas e provérbios populares de forma clichê, senso comum.

“O corriqueiro adágio de que o pior cego é aquele que não quer ver se aplica com perfeição na análise sobre o atual estágio da mídia: desconhecer ou tentar ignorar os incríveis avanços tecnológicos de nossos dias e supor que eles não terão reflexos profundos no futuro dos jornais é simplesmente impossível”.
(Jayme Sirotsky, Folha de São Paulo, 05.12.95)

M) Omissão de dados identificadores:

Com esse mecanismo, o redator cria uma expectativa no leitor acerca da ideia que será desenvolvida no parágrafo. Também pode ser chamado de parágrafo indutivo, pois vai deixando o tópico para o final.

As duas primeiras frases do parágrafo a seguir, criam no leitor certa expectativa em relação ao tema que se mantém em suspenso até a terceira frase:

“Mas o que significa, afinal, esta palavra, que virou bandeira da juventude? Com certeza não é algo que se refira à política ou às grandes decisões do Brasil e do mundo. Segundo Tarcísio Padilha ética é um estudo filosófico da ação e da conduta humana cujos valores provêm da própria natureza humana e se adaptam às mudanças da história e da sociedade”.
(O Globo, 13.09.92)

N) Parágrafos de causa & consequência:

Muitos temas propiciam a elaboração levando-se em conta os fatores causais e os decorrentes. Assim, o melhor é abordar o assunto de forma que se possa argumentar das duas formas: apresentando as causas e também as consequências.

Veja a seguir um exemplo de um parágrafo introdutório que leva ambos em consideração:

“A maior parte da classe política não goza de muito prestígio e confiabilidade por parte da população. A causa para isso pode ser o fato dos inúmeros escândalos de corrupção e o enriquecimento ilícito por parte dos eleitos. Em consequência, os grandes problemas que afligem o povo brasileiro deixam de ser convenientemente discutidos”.

*

Por fim, as possibilidades de construção de textos apontadas acima não se esgotam, pois, em termos de linguagem humana, os caminhos para nos comunicarmos bem são infinitos. (Adaptado do Módulo 01 de Redação/2005 – Integral)

5 comentários:

  1. Parabéns, muito bom e esclarecedor o texto.

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  2. Realmente, muito útil esse texto. Apenas gostaria de fazer um esclarecimento: as informações referentes à alusão histórica são de autoria de Othon M. Garcia, em seu livro Comunicação em Prosa Moderna (2006, p. 226).

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    1. Ana,

      Encontrei esse material nesta fonte:(Adaptado do Módulo 01 de Redação/2005 – Integral) citada no final dos textos.

      Obrigado,

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  3. Muito prático, ajudou muito. Obrigada!!

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