Reverência a Suassuna (Wilton Macêdo)
O
primeiro riso (a frase vem bem a calhar) sem ser gratuito foi com ele. Para os
itabunenses, demais grapiúnas e os outros naturalmente brasileiros, as formas
hilárias se davam (dão) por meio de estereótipos e preconceitos, o riso antes
valorizado como um dom puramente humano transformou-se em agressão animalescas
às minorias martirizadas pelas mazelas sociais, raciais, sexistas e machistas.
Se
a sociedade está na era supra-digital, também está na era do riso, ri-se de
tudo: do pobre, do flagelado, do negro, da mulher, do que tropica na rua, mas
nunca na intenção de desconstruir estereótipos, nem questionar suas causas,
logicamente é mais fácil ratificá-los. O humor é caricato e disso todos sabem,
é enxergar o quão perfeita é a imperfeição sem transformá-la em agressão,
entender essa distinção é um desafio para aquele que tem como ofício a comédia.
Essas
sutis diferenças me vêm à cabeça ao saber do encontro de Ariano Suassuna “com o
único mal irremediável” a morte. O chamado desse “fato sem explicação que iguala
tudo o que é vivo num só rebanho de condenados” me pareceu injusto,
principalmente no mesmo mês de julho que levou João Ubaldo Ribeiro, confesso
que está cada vez mais difícil entender os planos astrais.
Ariano
veio a mim como uma obrigação, se não ler o Alto da Compadecida não passa no
vestibular, embora me tivesse deixado levar pelo modismo de só estudar os temas
ligados às ciências (moda, sobretudo por que seria o que garantiria a entrada
na universidade), eu mais resignei-me a aceitar essa obrigação do que de fato
quis dentro de mim. Eu poderia ter feito algo que mantivesse a natureza do
livro sem precisar lê-lo completamente, o famigerado resumo (tão ineficaz
quanto o estudo somente das ciências).
Pois
bem, depois leitura feita dá logo pra perceber, que o que apaixona além do o
humor, é a criatividade mental sertaneja e do escritor, que fez rir com a
critica aquele que só conhecia as formas hilárias estereotipadas. Foi meu
primeiro riso de coisas que eu realmente entendia sem ser agressivo com as pessoas,
como de fato tudo tem seu tempo e hora ali carregava as críticas à pobreza, à
política, à pequenez humana, à miséria que o sertanejo foi (ou ainda é)
sujeitado. Essas minudências só foram entendidas depois.
Em
entrevistas e palestras Ariano mostrou-se rico e simples como sempre, com
menções críticas à cadência de nossa época e apreço aos loucos e mentirosos,
que como ele mesmo diz: “aqueles que criam uma outra realidade”, por isso se
identificava mais com Chicó. E agora talvez eu tenha percebido a intensidade
com que o humor de Ariano Suassuna formou meu humor.
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