"Um dos piores erros que os candidatos podem
cometer em uma prova de redação é a extrema preocupação com a forma, com a
gramática. O importante é que ele opine sobre o tema", explica a
coordenadora da banca de avaliação de redações da PUC-RS (Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul), Marisa Magnus Smith.
Já faz tempo que o segredo de escrever uma boa
redação deixou de ser o fato de não errar a gramática. Na opinião de
especialistas, acima de tudo, uma boa redação de vestibular - que nada mais é
do que um teste para averiguar a capacidade do estudante em opinar e refletir -
deve conter argumentação bem colocada e bem fundamentada.
Para se sair bem em sua "defesa", os
especialistas dizem que os candidatos não devem ficar "em cima do
muro" (ora a favor, ora contra o tema), tampouco comprar opiniões do
senso-comum. Se o candidato não estiver certo do que está dizendo e não expuser
razões para pensar daquela forma o texto fica vazio. "O texto tem que ter
posicionamento, se for exclusivamente informativo não é bom. Aliás, não dá nem
para começar a escrever um texto se não tiver uma opinião. Um texto sem opinião
não existe", reforça o professor de redação do Cursinho Anglo, Maurício
Soares Filho.
Para entender melhor por que os especialistas
defendem essa idéia é fácil: imagine que as drogas acabaram de ser legalizadas
pelo governo. Segundo os especialistas, se as pessoas abrem o jornal e procuram
um artigo sobre a questão e encontram um texto sem nenhuma argumentação ou opinião,
elas não refletirão, além de chato de ler. Para eles, aquilo que o leitor
espera de um articulista é o mesmo que um examinador de vestibular espera de um
futuro universitário (especialmente se for de universidade pública): opinião e
reflexão.
De acordo com Soares Filho, para seu texto causar
impacto, porém, a opinião deve estar muito clara. Por isso, a construção da
redação deve valorizar seus argumentos. A ordem é apostar na organização da
estrutura textual para não perder o fio da meada. "Organizar as
informações é o segredo para fazer que a opinião apareça", complementa
Soares Filho.
TREINANDO UM TEXTO NOTA 10
Se a intenção é obter destaque por meio de uma boa
argumentação, o que fazer para se preparar? Ler, ler, ler e escrever, escrever
e escrever. "O hábito da leitura ajuda a desenvolver a escrita. Além
disso, com a prática da redação, alguns padrões de textualidade são mais
facilmente assimilados do que pelo professor a falar em sala de aula",
enfatiza Marisa.
Para Soares Filho, a prova de redação é 50% leitura
e 50% escrita. "Uma é conseqüência da outra. O primeiro passo para ter
sucesso é ler o tema com muita atenção e, em seguida, posicionar sua opinião
para definir o que será defendido".
Uma boa dica é ler editoriais, crônicas, artigos e
textos assinados que emitam opinião sobre o tema que é retratado. Com isso, é
possível criar uma bagagem de como e em que momentos é pertinente evidenciar as
opiniões pessoais.
Outra dica valiosa é procurar ser autêntico. Na
hora de escrever um texto sobre a legalização das drogas ou do aborto ninguém
precisa "encarnar o revolucionário" para passar em um vestibular de
uma universidade famosa por sua histórica política de contestação. A
autenticidade do seu pensamento deve estar refletida em seu texto, nem mais, nem
menos.
"Como professor, uma de minhas preocupações é
esclarecer para os meus alunos que eles não devem fingir ser uma pessoa que não
são na hora de escrever, pois assim, vão ter dificuldades em sustentar os
argumentos, e fica muito fácil se contradizer, o que compromete a qualidade do
texto", diz Maurício.
Por fim, a prova de redação serve para avaliar a
capacidade do candidato de se comunicar por escrito, de fazer reflexão e de
conseguir se expressar de maneira simples e coesa. Por isso é tão importante
não ser superficial e mostrar uma visão crítica sobre o tema a ser discutido.
REDAÇÕES COMENTADAS
REDAÇÃO
DE Luíza Sampaio, aluna do 3º ano do Colégio Anchieta:
Tema:
A
Democracia envelheceu (perdeu a respeitabilidade) ou o homem perdeu o senso de
respeito ao seu semelhante?
Texto:
É
democrática toda ação que representa a expressão da vontade da maioria. A
Democracia é o princípio que, ao unir liberdades individuais e coletivas do
cidadão, permite a troca e o diálogo político, sem retirar do Estado o poder de
decisão em prol do bem estar da sociedade.
Nunca
existiu, entretanto, um regime verdadeiramente democrático no planeta, desde a
antiguidade até a era contemporânea. No passado recente da história humana,
dois sistemas políticos, aparentemente opostos, revelaram como o autoritarismo
controla as relações de poder entre os homens, desde sempre.
A
ditadura socialista errou ao partir do pressuposto de que todos os indivíduos
possuem as mesmas necessidades, errou ao sufocar a individualidade e o movimento
das massas com o autoritarismo. A ditadura socialista errou ao retirar do
cidadão o direito de se expressar, o direito de criticar.
Da
mesma forma, o capitalismo massacrou identidades ao impor produto e pregar
padrão comportamental, propiciando as condições de massificação da sociedade. O
jogo capitalista também tem sua forma requintada de manipular opiniões e
controlar as formas de comunicação. A ditadura do capital apresenta a
propaganda de uma sociedade guiada pela liberdade sem citar que para cada Estados
Unidos, paga-se o preço de uma África.
Cada
dia que passa, enfim, as nações se afastam do regime verdadeiramente
democrático. É necessário desenvolver um modelo humanista que saiba conciliar
as liberdades individuais e coletivas. Simultaneamente, o homem precisa ter
assegurados seus direitos fundamentais e, ainda, notar que existe liberdade
maior que a pura e simples liberdade de escolher entre as marcas A e B.
Comentário do professor Evert Reis:
Temos
aí uma redação de nível bastante competitivo. Atendendo perfeitamente ao
contexto do tema, ela define, primeiro, o que é Democracia para, em seguida,
responder, de maneira crítica e contundente, que nunca existiu, de fato, regime
democrático do planeta. Toma dois valores referenciais e desenvolve a ideia de
que eles sempre foram os manipuladores desse processo. O texto apresenta,
também, um nível de linguagem formal, elegante e argumentação criativa,
reafirmando pontos de vista com o uso de repetição enfática e objetiva.
A
estrutura frasal é outra boa marca desse texto. A conclusão poderia ser menor
(uma linha apenas) para ser mais perfeita, mas a fluência verbal é tão boa que
absorve tranquilamente esse detalhe. Quanto ao conteúdo, um tema dessa natureza
oferece um campo enorme de abordagem, mas no espaço oferecido de 25 a 30 linhas
o aluno deve ter o cuidado de selecionar seus tópicos para não tornar seu texto
denso ou prolixo.
Enfim,
o texto é claro, conciso, correto e de linguagem criativa. O vestibular não
espera menos que isso.
REDAÇÃO
DE Mauro Tupiniquim, aluno do 3º ano do Centro Federal de Educação
Tecnológica da Bahia (CEFET-BA):
Tema:
Citação
escolhida pelo aluno para a produção do texto dissertativo: “Com as mudanças
climáticas, o cotidiano de bilhões de pessoas foi diretamente afetado e, para
evitar a piora da situação, é preciso que haja o controle de um dos maiores
responsáveis pelo aquecimento global: o efeito estufa.”
Texto:
O
elevado desenvolvimento capitalista, em um contexto de avanço tecnológico
histórico na produção de materiais, provoca uma série de conseqüências, as
quais podem ser desastrosas para o nosso planeta. A pressão do setor financeiro
especulativo sobre os “detentores do capital” acentua o fenômeno da dominação
econômica, não deixando espaço para solução de danos, como o do efeito estufa,
inviabilizando as propostas criadas por cientistas renomados, alguns da NASA,
para “salvar o planeta”.
Desde
meados do século passado até a atualidade, a sociedade capitalista, firmada
como soberana (com o fim da União Soviética) , vem acumulando uma série de
detritos e restos resultantes da alta produção e resultante consumo de
produtos. Esse lixo produzido em vasta quantidade, de composição altamente
agressiva ao equilíbrio ecológico do planeta, vem causando prejuízos e danos às
populações humanas como o caso do “Furacão Catrina” que arruinou cidades, no
segundo semestre de 2006.
Dos
danos previstos para o futuro, se nada for feito, acredita-se que o
derretimento das calotas polares, causado pelo efeito estufa, será o mais
significativo pois alagará cidades costeiras economicamente importantes como
Nova York, principalmente a Ilha de Manhathan.
Mesmo
com o perigo eminente dessas conseqüências, previsto para menos de 30 anos, os
grandes capitalistas se recusam a gastar dinheiro em investimentos necessários
para tentar evitar tais conseqüências. O principal argumento é que os
investimentos são caros demais para serem arcados por eles.
Se
continuarmos nesse ritmo, é penoso afirmar que não haverá saída para a
civilização humana senão a adaptação a essas novas mudanças. A questão será se
o ser humano conseguirá se adaptar a elas ou se seremos vítimas do nosso
próprio fracasso.
Comentário
da Professora Conceição Araújo:
O
texto tem uma linguagem clara e fluente. Os argumentos são sólidos e
contundentes. Não há problemas de coerência e coesão, elementos indispensáveis
a um bom texto dissertativo.
Observações
específicas sobre o tratamento do tema:
1.
O aluno sublinha, na citação, o eixo central do tema proposto. Essa atitude
demonstra que o aluno fez uma leitura interpretativa atenciosa. Iniciando dessa
forma, pôde avaliar as possibilidades de escrita bem como a opção pela via de
análise que mais seja apropriada para dissertar sobre o tema: o efeito estufa.
2. No 1º parágrafo, o aluno detecta e examina a raiz do problema apresentado na citação: o capitalismo.
3. No 2º , faz um breve comentário crítico sobre o lixo produzido pelo consumo exagerado de produtos, considerado como mais um elemento causador do efeito estufa, o que resulta em catástrofe ambiental, exemplificando com fato recente, divulgado pela mídia.
2. No 1º parágrafo, o aluno detecta e examina a raiz do problema apresentado na citação: o capitalismo.
3. No 2º , faz um breve comentário crítico sobre o lixo produzido pelo consumo exagerado de produtos, considerado como mais um elemento causador do efeito estufa, o que resulta em catástrofe ambiental, exemplificando com fato recente, divulgado pela mídia.
4. No 3º, destaca a recusa dos grandes capitalistas, em investir em soluções para o problema.
5. No 4º, acrescenta informação sobre previsão de catástrofe, num futuro bem próximo, em âmbito internacional.
6. Conclui coerentemente, apesar de não oferecer uma proposta de solução objetiva e prática para a questão, considerando a complexidade do tema abordado.