21/03/2013 07h47 - Atualizado em 21/03/2013 10h31
Entenda
por que redação do Enem com hino e miojo não vale nota zero
Segundo órgão que aplica o
Enem, fuga do tema foi parcial nas redações.
Textos com hino do Palmeiras e receita de miojo tiveram nota 500 e 560.
Textos com hino do Palmeiras e receita de miojo tiveram nota 500 e 560.
Ana Carolina Moreno
Do G1, em São Paulo
Os candidatos do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) que inseriram uma
receita de miojo e trechos do hino do Palmeiras na redação disseram ao G1 que
esperavam tirar nota zero na prova. Segundo eles, a intenção era testar o
sistema de correção da prova de redação. No entanto, de acordo com Paulo
Portela, diretor-geral do Centro de Seleção e de Promoção de Eventos (Cespe),
órgão da Universidade Federal de Brasília (UnB) responsável pela aplicação do
Enem, o edital do exame tem regras claras sobre as transgressões que anulam a
prova. E trechos fora de propósito escondidos entre parágrafos pretensamente
sérios não configuram uma fuga completa ao tema. Esta falha só existe se o
candidato não cita a proposta da prova em nenhuma parte de seu texto.
Fernando Maioto Júnior e Carlos Guilherme Ferreira tentaram testar sistema de correção da redação do Enem (Foto: Reprodução/Arquivo pessoal) |
Nesta
semana, as redações de dois estudantes que já estavam matriculados no ensino
superior, e por isso fizeram o Enem sem pretensão de tirar nota alta, acabaram
ganhando destaque pela peculiaridade dos textos. Fernando César Maioto Júnior,
de São José do Rio Preto (SP), inseriu no meio da redação sobre imigração no
século 21 trechos do hino do Palmeiras e tirou nota 500 --a pontuação vai de 0
a 1.000.
Já
Carlos Guilherme Custódio Ferreira, de Campo Belo (MG), decidiu ensinar uma
receita de 'miojo' antes de concluir seu texto intitulado "Imigração
ilegal", que acabou avaliado com a nota 560. O objetivo dos dois era
provar que os corretores não liam as redações com atenção e, por isso, a nota
dos candidatos era aleatória.
Fernando
e Guilherme afirmaram que a nota mais justa para seus textos seria zero. Porém,
para Portela, do Cespe, as notas 500 e 560 para as redações dos dois estudantes
é prova de que os corretores não só leram os textos, mas também os corrigiram
seguindo os critérios previstos no edital. "Não é aleatória, se você
verificar onde eles levaram a menor nota, vai ver que foi nessas competências
específicas. A nota baixa reflete exatamente que, quando ele utilizou
argumentos completamente fora de propósito, ele foi apenado justamente por
isso", explicou Portela ao G1.
"Se
quisesse testar o sistema, poderia fazer um texto sobre a imigração no século
21 no Brasil e apresentar uma proposta de intervenção que ferisse os direitos
humanos. Se fizesse isso, ele teria a nota zero", afirmou.
Ele
afirmou ainda que a pontuação dos dois candidatos é considerada "o limite
da reprovação", já que, por exemplo, um participante que queira usar o
Enem para conseguir a certificação do ensino médio deverá tirar no mínimo 500
na redação para obter a qualificação em linguagens e códigos.
Nota
dividida em cinco partes
Pelas
regras de correção, a nota final da redação do Enem é a soma aritmética de
cinco notas, atribuídas de acordo com competências diferentes. Por isso, a
correção não leva em conta apenas se o estudante falou apenas sobre o assunto
proposto, mas também se seguiu as regras da norma padrão da língua portuguesa,
se usou a estrutura de texto dissertativo-argumentativo, se concluiu a prova
com uma proposta de intervenção para o problema apresentado, entre outros (veja
as competências na tabela abaixo):
COMPETÊNCIAS AVALIADAS NA PROVA DE REDAÇÃO DO
ENEM
|
||||
Competência 1
|
Competência 2*
|
Competência 3
|
Competência 4
|
Competência 5
|
Demonstrar domínio da norma padrão da língua
escrita.
|
Compreender a proposta de redação e aplicar
conceitos das várias áreas de conhecimento para desenvolver o tema dentro dos
limites estruturais do texto dissertativo-argumentativo.
|
Selecionar, relacionar, organizar e interpretar
informações, fatos, opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista.
|
Demonstrar conhecimento dos mecanismos
linguísticos necessários à construção da argumentação.
|
Elaborar proposta de intervenção para o problema
abordado, respeitando os direitos humanos.
|
Valor: 0 a 200
|
Valor: 0 a 200
|
Valor: 0 a 200
|
Valor: 0 a 200
|
Valor: 0 a 200
|
(*) OBS: Caso o
candidato tenha nota zero na Competência 2, ele terá a prova anulada
Fonte: MEC/Inep |
Cada
competência vale no máximo 200 pontos e, segundo Portela, a 2ª competência é a
única que o candidato não pode zerar, porque isso anulará a prova. Ela fala
justamente sobre abordar o tema proposto pela prova e, ainda, exige que o
candidato elabore um texto usando a estrutura dissertativa-argumentativa.
Segundo Portela, isso quer dizer, por exemplo, se candidato escreveu apenas
sobre imigração, mas montou um texto em forma de poema, sua nota final será
zero, mesmo que ele tenha cumprido as demais competências.
“Há
introdução, desenvolvimento, você percebe que eles entram em hinos de time e em
uma receita, que perdem a coerência textual, mas no final ainda voltam e
concluem o texto"
Paulo Portela, diretor-geral
do Cespe/UnB
Fuga
do tema foi apenas parcial
No
caso dos estudantes paulista e mineiro, o diretor-geral do Cespe/UnB diz que
ambos cumpriram parcialmente a 2ª competência, porque sua redação foi
dissertativa-argumentativa e o tema correto foi abordado tanto na introdução
quanto na conclusão do texto.
"Essas
duas redações que vêm sendo discutidas na internet, quando você olha para a
estrutura delas, há introdução, desenvolvimento, você percebe que eles entram
em hinos de time e em uma receita, que perdem a coerência textual, mas no final
ainda voltam e concluem o texto", explicou Portela.
"Eles
entram no tema, se perdem um pouco, como se o participante estivesse se
perdendo no desenvolvimento, e no final fazem uma conclusão. Não é a conclusão
esperada para uma nota alta, tanto que foram notas muito baixas."
A
correção, segundo ele, deve seguir as regras do edital, mas os corretores, que
em 2012 tiveram uma capacitação durante dois meses sobre todos os itens da
avaliação da prova, também levam em conta o fato de que os candidatos são
concluintes do ensino médio e fazem a prova sem o uso de recursos como
gramática, corretor ortográfico e internet para buscar argumentos na hora de
desenvolver a dissertação.
Nota
zero
Ainda
de acordo com o diretor do Cespe, mesmo com o aumento anual no número de
candidatos do Enem, "o percentual está mais ou menos estabilizado em
termos de redações brancas". O item 14.9 do edital do Enem 2012 estabelece
as regras para que uma redação leve nota zero e, portanto, seja anulada:
14.9 Em todos as situações expressas abaixo,
será atribuída nota zero à redação:
14.9.1 que não atender a proposta solicitada ou que
possua outra estrutura textual que não seja a do tipo
dissertativo-argumentativo, o que configurará “Fuga ao tema/não atendimento ao
tipo textual”;
14.9.2 sem texto escrito na Folha de Redação,
que será considerada “Em Branco”;
14.9.3 com até 7 (sete) linhas, qualquer que seja o conteúdo, que configurará “Texto insuficiente”;
14.9.3 com até 7 (sete) linhas, qualquer que seja o conteúdo, que configurará “Texto insuficiente”;
14.9.3.1 linhas com cópia dos textos motivadores
apresentados no Caderno de Questões serão desconsideradas para efeito de
correção e de contagem do mínimo de linhas;
14.9.4 com impropérios, desenhos e outras
formas propositais de anulação, que será considerada “Anulada”.
Portela
afirma que o fato de os candidatos receberem o espelho da redação desde a
edição de 2012 do exame pode fazer com que mais estudantes tentem repetir o
exemplo de Fernando Maioto Júnior e Carlos Guilherme Ferreira.
"É
possível que um candidato tente testar a banca, mas essa banca vai estar cada
vez mais preparada para tratar uma situação como essa."
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