Corretor
do Enem desabafa: “Vejo meu trabalho ir por água abaixo”
Em entrevista, professor de
redação conta bastidores e problemas da correção
LAURO NETO (EMAIL)
RIO - A correção da redação do Exame
Nacional de Ensino Médio (Enem) não está provocando insatisfação e revolta
apenas entre os candidatos. Em entrevista ao GLOBO, um professor de redação que
foi corretor desta edição da prova conta os bastidores do processo gerenciado
pelo consórcio Cespe/UnB e desabafa: “Estou vendo o trabalho que fiz durante
todo o ano sendo jogado por água abaixo. É muito revoltante!”. Professor de
colégios tradicionais do Rio de Janeiro e integrante de bancas de vestibulares
consagrados, ele não pode ser identificado, pois assinou um contrato de sigilo.
Leia a entrevista.
O
GLOBO: Por que a correção da redação este ano está causando tanta
polêmica?
O processo de correção já começou com
um problema, pois os supervisores tiveram um aumento de trabalho e ganham fixo,
enquanto o corretor ganha R$ 1,60 por redação corrigida. Houve um aumento do
trabalho, pois a discrepância necessária para a terceira correção, que é feita
pelos supervisores, caiu de 500 para 300 pontos. Isso aconteceu sem que o valor
pago a cada supervisor fosse aumentado. Havia um certo mal estar na supervisão.
Teve um supervisor que desistiu uma semana antes de começar o processo. Havia
muito insatisfação. Parece que alguns supervisores fizeram o trabalho de má
vontade por serem mal remunerados. Estou muito irritado porque estou vendo o
trabalho que fiz durante todo o ano sendo jogado por água abaixo. É muito
revoltante!
Mas não
houve uma preocupação em melhorar a correção diante dos problemas do último
Enem?
O Cespe aprimorou o sistema de
avaliação da correção. O corretor é avaliado constantemente, principalmente no
tempo em que cada redação fica aberta na tela do seu computador. Mas o corretor
também erra, e a correção on-line dá brechas para burlar os filtros de qualidade.
Como é feita
essa avaliação?
Cada corretor recebe diariamente uma
nota da sua correção. Se não mantiver uma média 8, pode ser cortado do
processo. Teve gente cortada durante o processo de correção. Mas não sabemos o
que aconteceu com as redações que foram corrigidas por essas pessoas. Também
houve pessoas que abandonaram a correção no meio, e as redações foram
redirecionadas a outros corretores.
Como foi
feita a distribuição das redações para os corretores?
Recebemos diariamente 100 redações pela
internet. No nosso envelope virtual, existe uma redação corrigida por alguém da
banca Cespe, que chamamos de redação de ouro. É uma maneira de o Cespe ficar
atento aos corretores. Há outra redação no pacote que é corrigida por muitos
corretores. Ela recebe uma nota média para verificar a qualidade e a coerência
da banca. Mas não sabemos quais notas prevalecem.
Quanto tempo
você demorava para corrigir uma redação?
Gastava de 2 minutos e meio a 3 minutos
por redação, de 2 duas horas e meia 3 horas por dia para corrigir as redações.
Se todo mundo seguisse o treinamento do Cespe, não haveria problemas. No Rio,
os professores são muito experientes. Mas não sabemos como foi feito o
treinamento nos confins do Brasil.
O que difere
correção da redação do Enem de outros vestibulares?
O nível de exigência é menor do que se
cobra normalmente nos colégios dos grandes centros urbanos. Fomos instruídos
pelo Cespe a dar notas 900 ou 1.000 em redações que valiam 600. A nota zero
sempre tem que ter vista por uma terceira pessoa, por um supervisor que é
sempre ligado a uma universidade. Mas o Cespe se nega a conceder a revisão de
fato. Isso demonstra que há uma vulnaberalidade no sistema, pois é um direito
do candidato.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/vestibular/corretor-do-enem-desabafa-vejo-meu-trabalho-ir-por-agua-abaixo-3640827#ixzz2NuccEQP6
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